Sofia

Sofia saboreava um croque monsieur num pequeno café em Paris.  A temporada de turismo iria começar e a cidade logo estaria lotada.  Ela já sentia saudade mesmo antes de voltar ao Brasil.
Sua cabeça pulava de um assunto para outro, mas sempre voltava para sua carreira em medicina experimental .  Ser expulsa da Université Montpellier não fica bem em nenhum currículo.  Sua tese de doutorado estava quase pronta, “Pseudo Potenciais Evocados Induzidos por Ressonância Eletromagnética”.  Ela sentia muita raiva, ser punida por estar certa era o máximo da injustiça.  Entre uma mordida e outra ela lembrou as palavras de seu pai:
– Estar certo não é suficiente.
E não era mesmo.  Depois de um ano meio de discussões com o orientador de sua tese ela resolveu mostrar de forma inequívoca que estava certa.  Usando o próprio cérebro, conseguiu mapear as pequenas flutuações elétricas no córtex visual induzidas por uma bobina de alta tensão.  Marcou uma reunião no laboratório com o emérito professor.  Explicou cuidadosa e pausadamente todo o experimento.  Estoicamente aguentou o longo discurso cheio de reprovações que recebeu ao final de sua exposição.  Só perdeu a calma quando ele a chamou de burra.  Nesse instante ela gritou:
-Veja!
E ligou a máquina.  Imediatamente ambos estavam cegos.  Isso durou apenas alguns segundos e não causou nenhum dano cerebral permanente.  No dia seguinte em uma reunião de emergência da Comissão de Ética e Pesquisa ela foi sumariamente expulsa.  A comunidade científica é pequena, poucos dias após, todo mundo que é algum em neurologia sabia do acontecido.  A história é claro havia aumentado e em algumas versões o orientador fora amarrado e eletrodos postos em sua cabeça à força.  Ninguém, ou nenhum cientista respeitável, acreditava que o cérebro pudesse ser influenciado à distância de forma direta.  Sofia contudo acreditava e havia provado.
Nos momentos de sua vida em que se sentia perdida, Sofia sempre fazia algo, um gesto para marcar o momento e romper com o passado. Enquanto terminava de comer ele tomou uma decisão, cortar o cabelo bem curto e tingi-lo de vermelho.  Não, vermelho era muito óbvio iria tingir de púrpura!

No Laboratório

Sozinho em seu laboratório Doktor Orfanik olha pensativo para um capacitor de tântalo.  Toda tecnologia do século 21 é para ele algo não muito confiável, cada instrumento e dispositivo que ele usa fora cuidadosamente construído à mão.  Ainda assim alguma concessão podia ser feita.  Um antigo grimório do século treze aberto na bancada serve de orientação para a construção de uma máquina estranha.  O componente é soldado cuidadosamente, apenas um pequeno filamento de fumaça.  Nesse instante uma luz vermelha acende.  Uma mensagem de algum dos poucos e fiéis seguidores de Orfanik.  Télek saiu da Transilvânia. Isso poderia ser uma boa ou má notícia, provavelmente ruim.  Nada a fazer por enquanto, de volta ao laboratório.
Muitas horas de trabalho depois a máquina está pronta, cada sub-componente havia sido cuidadosamente testado.  Ligada a máquina, ela não funciona.  Sem desanimar, Orfanik re-testa e verifica cada aspecto até que exausto cai no sono.
Quase imediatamente após dormir começa um sonho.  Um dragão azul o persegue em uma caverna.  A cabeça do dragão se transforma na cabeça de Télek.  Orfanik mata o dragão e abre sua barriga.  De dentro retira a maquina na qual trabalhava.  Cada peça da maquina se transforma em um inseto.  Um dos insetos olha para Orfanik e começa aumentar de tamanho.  Orfanik sobe em suas costas e o animal, semelhante a um besouro alça vôo. Logo está em uma cidade e pousa aos pés de uma torre de ferro.  Lentamente a torre se desvanece até desaparecer totalmente.  Quando a torre sumiu Orfanik vê o rosto de uma jovem de cabelos púrpura. Ela diz:
– Olá.
Ele acorda imediatamente. Lembra-se perfeitamente do sonho, corre imediatamente para o computador e inicia uma busca.  Digita: A dama que dissolveu a Torre Eiffel.